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Deserto de Namib

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O dramtico encontro do Deserto de Namib

com o Oceano Atlntico, na Nambia, j foi o pesadelo de centenas de nufragos. Uma vez a salvo do mar, era preciso enfrentar um dos lugares mais desolados da frica - como atestam os esqueletos de barcos e homens que povoam o lugar.

por Xavier Bartaburu, de Windhoek
fotos Ricardo Rollo

Ironia do Destino
O litoral da Nambia um dos mais
traioeiros do mundo. Como se no
bastasse, quem tem o azar de naufragar
aqui ainda precisar cruzar o mar
de dunas do Deserto de Namib.

Se voc quiser escapar vivo da Costa do Esqueleto, a pior idia que pode lhe surgir caminhar terra adentro. O Deserto de Namib ocupa uma faixa litornea que chega a at 50 quilmetros de largura. Voc simplesmente andar por dias e dias sobre as dunas sem ver nem um fiapo de gua. Se voc tiver a boa fortuna de sair do deserto, ainda ter sua frente uma vasta regio semi-rida e montanhosa, igualmente remota e hostil. Em abril deste ano, um casal de turistas holandeses ficou sem gasolina numa estrada vicinal em pleno semi-rido namibiano. Foram encontrados apenas duas semanas depois. O homem estava morto.

Suponhamos que voc tenha sobrevivido a um naufrgio na Costa do Esqueleto.
Seu barco foi arremessado pelas guas do Oceano Atlntico contra o litoral da Nambia e s voc pde sair vivo. Golpe de sorte? Nem tanto. Centenas de nufragos j acreditaram estar salvos quando pam os ps em terra firme, s para depois descobrir a morte lenta que os aguardava no Deserto de Namib, uma terra inspita que se esparrama por1 600 quilmetros ao longo da costa sudoeste da frica. esse vasto cemitrio de homens e navios que voc ter que enfrentar se quiser sair daqui com vida. O mar de dunas, a nvoa desorientadora, a falta de gua, os horizontes interminveis e os lees esto sua espera. Do mar, voc est a salvo. Agora preciso sobreviver ao deserto.

Errantes do Deserto
O rix um dos poucos animais que
podem ar semanas sem beber gua.
S assim para sobreviver a um dos
desertos mais inspitos do mundo.

FOCAS A GRANEL
beira do mar, s focas conseguem viver.
Suas colnias podem chegar a 50 mil
indivduos. Deserto adentro, o povo
himba que ocupa a maior parte
do territrio.

O Namib um dos desertos mais antigos do mundo. H 80 milhes de anos, a areia vem sendo pacientemente depositada ao longo da costa. Acredite: quase toda a areia do Namib vem do mar, carregada pelo aluvio do Rio Orange, ao sul, at o Oceano Atlntico, e da levada pela corrente martima e pelo vento at o litoral da Nambia. O resultado desse longo trabalho um interminvel manto de dunas que se debrua sobre as guas frias do Atlntico e redesenha o mapa da Costa do Esqueleto a cada dia. Praias, baas e ilhas que os navegadores portugueses mapearam j no existem mais. Algumas das dunas, como as de Sossusvlei, no Parque Namib-Naukluft, chegam a at 300 metros de altura. So, pelo que se diz, as mais altas do mundo.

Isso tudo seriam belas praias tropicais se cho-vesse mais do que os 15 milmetros por ano que gotejam sobre a Costa do Esqueleto (a precipitao anual da Amaznia de 2 500 milmetros por ano). No lugar da chuva, quem d as caras por aqui uma nvoa espessa que, toda manh, invade o deserto e se alastra por at 50 quilmetros sobre o continente. Obra do singular encontro da fria Corrente de Benguela com o ar quente do deserto, a nvoa, em seu caminho, vai se depositando nas poucas espcies de plantas que vivem no deserto. Plantas essas que servem de alimento a animais como elefantes, girafas e antlopes. assim que a vida se sustenta no Namib.

Uma das plantas vem se alimentando dessa forma h milhares de anos. a Welwitschia mirabilis, apelidada por Charles Darwin de "ornitorrinco do reino vegetal". A planta, endmica do Namib, um milagre da evoluo. S com a nvoa matinal, cada exemplar pode viver cerca de 2 mil anos. Por causa de sua estranha forma - apenas duas folhas rgidas e fibrosas acopladas a um caule grosso e achatado -, os botnicos consideram a Welwitschia uma espcie de rvore an. Outra planta que sobrevive bem s duras condies do deserto o melo !nara (o ponto de exclamao significa um estalido com a lngua no idioma falado pela tribo nama). Com sua raiz de 40 metros de profundidade, a planta tira do lenol fretico toda a gua de que precisa para viver.

Osis Correntes
Os rios funcionam como
osis lineares e abrigam
quase toda a vida do
deserto. S h dois rios
perenes em toda a
costa da Nambia.
O Kunene o que faz
fronteira com Angola.

Besouros ao Avesso. Os insetos do Namib so outros que tambm bebem diretamente dessa nvoa. o caso das formigas. Numa comovente amostra de solidariedade, cada formiga bebe as gotas da nvoa que se condensou sobre o corpo da outra. Ainda mais estranha a estratgia de uma espcie de besouro da famlia dos tenebriondeos, o Onymacris unguicularis. O bichinho apia-se sobre a cabea com o abdome virado para o vento, deixando a nvoa condensar-se sobre seu corpo e assim escorrer diretamente sobre a sua boca.

Nvoa pode ser bom para insetos e plantas, mas para quem est disposto a tentar escapar das armadilhas do deserto pode ser o fim. Imagine-se, recm-sado de um naufrgio, perdido no meio de uma nvoa costeira que no lhe permite ver um palmo adiante e que, para piorar, vem acompanhada pelo ronco gelado do vento sudoeste que sopra sobre as dunas. Agora imagine como seria para os antigos navegantes enfrentar um mar revolto repleto de recifes e bancos de areia - e no meio da neblina. fcil supor por que a Costa do Esqueleto era considerada um dos litorais mais traioeiros do planeta.

O litoral inteiro da Nambia est tomado pelo deserto. A parte sul uma zona proibida, restrita explorao de diamantes - alis, a maior riqueza do pas. A metade norte o que a Histria se encarregou de chamar de Costa do Esqueleto. O termo foi cunhado em 1933 por um jornalista local ao sobrevoar a rea em busca de um aviador suo que tentava quebrar o recorde de vo solo entre a Cidade do Cabo, na frica do Sul, e Londres. Do avio, ele viu os esqueletos de navios e homens que haviam perecido nas areias do Namib no decorrer dos sculos. O aviador nunca foi encontrado, mas o nome pegou. Antes da chegada do jornalista, a regio era conhecida pelo no menos sombrio nome de Areias do Inferno, dado pelos navegantes portugueses que, sob o comando de Diogo Co, aportaram nestas terras em 1485.

Diante de um lugar que j foi chamado de inferno, resta a pergunta: possvel sobreviver Costa do Esqueleto? , se voc conhecer o mnimo da geografia local e entender os mecanismos que regem o Deserto de Namib. Caminhar terra adentro voc j sabe que no o levar a lugar algum. Esperar por socorro sempre um risco. E, alm-mar, o trecho de terra mais prximo , ironicamente, o Brasil, que fica a nada menos do que 4 mil quilmetros da Nambia. A soluo ser, por mais descabida que esta idia parea, percorrer a orla martima, acompanhando o deserto em sua extenso.

No se assuste se tropear em algum esqueleto de navio. Eles esto por todo lugar, relembrando as centenas de naufrgios que j tiveram o azar de vir parar nesta costa. Desde o sculo 18, foram registrados mais de 500. A razo de tamanha cifra que as guas que banham a Nambia esto entre as mais ricas do mundo. A Corrente de Benguela prdiga em plncton, que serve de alimento a uma imensa variedade de vida marinha. E atrai, obviamente, uma imensa variedade de barcos pesqueiros. A pesca, hoje, representa a segunda maior renda da Nambia.

A maioria dos navios j est corroda pelo mar, mas ainda se pode encontrar os resqucios dos naufrgios mais recentes, alguns com menos de 30 anos. Um dos mais dramticos aconteceu em 1942. Numa noite chuvosa, o navio britnico Dunedin Star encalhou e 63 ageiros vieram parar numa praia remota do extremo norte da Costa do Esqueleto. Sobreviveram por 26 dias recebendo comida de bombardeiros que sobrevoavam a rea. Um desses avies, por azar, acabou caindo no oceano, mas seus ocupantes milagrosamente saram vivos. E um barco de resgate, por azar ainda maior, tambm naufragou. Dois dos tripulantes morreram.

ando de naufrgio em naufrgio, se voc tiver muita sorte, possvel que esbarre numa das nicas quatro cidades ao longo de todo o litoral da Nambia. So os portos de Swakopmund, Lderitz, Henties Bay e Walvis Bay. Os nomes de sotaque germnico no so toa: a Nambia foi, durante 30 anos, uma colnia alem. Em Swakopmund, por exemplo, voc vai encontrar ruas com nomes como Kaiser-Wilhelm-Strasse, casas em estilo enxaimel, cervejarias e chucrutes. E tudo em pleno deserto africano.

Mais provvel, porm, que encontrar uma cidade voc acabar topando com um dos rios que rasgam o deserto e desguam no Atlntico. Mas no espere encontrar fozes derramando gua fresca e farta sobre o oceano. O litoral da Nambia tem apenas dois rios perenes: o Kunene, ao norte, que faz fronteira com Angola, e o Orange, ao sul, que delimita a divisa com a frica do Sul. Entre ambos, s o deserto e o seu punhado de rios sazonais. O que j basta. Os especialistas chamam esses rios de "osis lineares", responsveis por abrigar quase toda a vida do Namib. E so esses rios que vo salvar a sua.

UMA NAO JOVEM


Perto de outros pases africanos, a Nambia quase um recm-nascido. Sua independncia tardia veio apenas em 1990, depois de um longo e doloroso processo. Os alemes ficaram por aqui de 1884 a 1915, chamando a colnia de frica do Sudoeste. At hoje, um quinto da populao branca fala alemo e mantm traos de sua cultura, especialmente em Swakopmund (foto). Durante a Primeira Guerra Mundial, a frica do Sul invadiu o territrio e ou a istr-lo em nome da Coroa inglesa, com direito a apartheid e tudo. A luta pela independncia comeou nos anos 50, pelas mos da Organizao Popular da frica do Sudoeste (Swapo). E tornou-se uma briga feia a partir dos anos 70, quando o governo comunista de Angola ou a apoiar a guerrilha da Swapo e a frica do Sul se viu obrigada a mobilizar seu exrcito para a fronteira norte da Nambia. A paz s foi alcanada com a interveno da ONU. Mais de 70 anos de influncia sul-africana, porm, deixaram uma marca indelvel na Nambia. Embora a lngua oficial seja o ingls, o africner o idioma mais falado pela populao. Economicamente, a Nambia um dos pases mais bem situados do continente, fiel retrato da boa qualidade de vida atingida pela frica do Sul. E produto, tambm, da rica explorao de diamantes no Deserto de Namib.

A vida na aridez
Os salares existem onde
a gua do mar secou.
Mesmo com tanta aridez,
aqui vivem espcies raras,
como o quase extinto
rinoceronte negro
e a endmica
zebra-de-hartmann.


Como chove pouco por aqui, so grandes as chances de voc encontrar um leito de rio seco. Procure com calma e voc encontrar alguma fonte natural brotando no meio do rio. Elas atraem todo tipo de animais, que vm de longe em busca de alguns preciosos goles de gua. Quando no a fonte, so os arbustos molhados de nvoa que abastecem as criaturas do deserto. E assim voc vai entender por que o Namib um dos lugares mais fascinantes do mundo, capaz de sustentar as mais variadas formas de vida num lugar aparentemente estril.

Os ltimos Rinocerontes. Voc ver surgir antlopes como o rix, animal que possui um sistema interno de refrigerao que lhe permite sobreviver durante semanas sem beber gua. Voc ver girafas, zebras, gazelas e os ltimos rinocerontes negros selvagens da frica. Existem apenas 3 mil deles em todo o continente, dizimados pelos caadores que vendem o chifre para fazer adagas no Imen e afrodisacos na China. H 30 anos, eram 65 mil. Hoje, os que restam esto confinados em reservas como Etosha, o mais importante parque nacional da Nambia, a 300 quilmetros da costa. Mas s o Namib tem rinocerontes livres, cerca de 150. Graas, em parte, organizao Save The Rhino, que vem fazendo jus ao nome h duas dcadas e acaba de inaugurar um acampamento para receber turistas.

Voc ver tambm os mticos elefantes do deserto, animais especialmente adaptados a viver em condies hostis. Com pernas mais longas que seus parentes da savana, caminham por at quatro dias sobre as dunas em busca de gua. E, com a tromba, cavam o leito do rio at encontrar uma fonte.

E voc ver lees. Sim, eles tambm fazem parte do Namib. Vieram do semi-rido, caminhando lentamente pelo leito dos rios at chegar costa. E, como a vida animal daqui no to abundante como a da savana, tiveram de se adaptar ao cardpio disponvel. E acabaram descobrindo uma nova fonte de alimento nas focas e nas baleias encalhadas que ocupam as praias da Costa do Esqueleto. Refeio que eles compartilham com hienas e chacais. Aqui, os lees vo praia.

Feras assim so apenas um obstculo a mais para quem est perdido no Namib. E bom ficar de olho. Se voc quiser sobreviver, o nico caminho possvel subir o leito do rio - logo onde os lees am a maior parte do tempo. Mas as chances de que voc acabe encontrando gente antes. a lgica: sempre h algum na margem de um rio. S no espere encontrar cidades. Elas no existem em todo o Kaokoveld, como chamado o noroeste da Nambia. mais fcil esbarrar numa tribo himba, o nico povo que consegue habitar esta que uma das terras mais selvagens da frica.

Sobreviventes
No meio de tanta
desolao, preciso
adaptar-se realidade do
deserto. o que faz o povo
himba e animais como a
girafa. Ambos chegam a
andar vrios quilmetros
em busca de alimento.

Mulheres de Vermelho. Os himbas so um dos ltimos povos seminmades do continente. No sculo 15, vieram migrando da Etipia com suas ovelhas e bois at parar na Nambia. Alguns deles foram para as cidades, assumiram o estilo de vida do colonizador e se transformaram nos hereros. Os himbas que hoje vivem no norte do pas so uma verso arcaica dos hereros, donos de tradies centenrias que se mantiveram quase intactas. Uma delas o hbito das mulheres de cobrir o corpo com um leo avermelhado, mistura de banha de boi com uma pedra local. assim que fazem o asseio dirio e se protegem do sol. As himbas tambm comandam uma sociedade poligmica, em que cada mulher pode ter relaes sexuais com vrios homens. "Todo o mundo aqui rouba a mulher do outro", explica o sorridente Tjipo, feliz em poder falar com estrangeiros em sua lngua natal: o portugus.

Os himbas vivem prximos ao Rio Kunene, que divide Nambia e Angola, e circulam livremente entre os dois pases. Muitos nasceram em solo angolano e acabaram aprendendo o portugus. Mas no esto nem a para fronteiras. Vagam pelo deserto assim como os lees e os elefantes, e chegam a caminhar at 80 quilmetros em busca de gua para o gado. Tanto esforo vale a pena: o gado bovino o principal smbolo de status de uma famlia himba, e seu roubo o nico crime punvel com morte. Sua carne reservada apenas para eventos especiais, como casamentos e funerais. Quando um himba morre, mata-se uma parte de seu gado e as cabeas so empilhadas ao lado da sepultura, para proteger o esprito de quem morreu. Em toda aldeia himba, h sempre um curral no meio, vigiado por um fogo sagrado chamado okuruwo. Os feiticeiros o usam para fazer contato com os ancestrais.

Uma vez encontrados os himbas, considere-se salvo. Voc ainda ter de caminhar uns bons dias at chegar a alguma pista de pouso ou algum vilarejo com um mnimo de estrutura, j que a Nambia um dos pases com menor densidade populacional do mundo (dois habitantes por quilmetro quadrado). Mas j no corre mais risco de vida. Quem sabe a voc poder enfim prestar ateno ao ambiente que lhe cerca e perceber que est num dos lugares mais bonitos e mais intocados do planeta.

A lei do mais forte
Os elefantes adaptados a
viver no deserto podem
caminhar at quatro dias
sem gua.

Verdade, porm, seja dita: voc no precisa naufragar nas guas da Nambia para ver de perto as maravilhas da Costa do Esqueleto e do Deserto de Namib. Voc pode fazer como fazem milhares de turistas por ano: pegar um Cessna na capital, Windhoek, e voar at um acampamento estrategicamente localizado no meio do deserto e dotado de uma infra-estrutura razovel. A Costa do Esqueleto, felizmente, no mais o pesadelo dos antigos navegantes, embora seja um lugar hostil onde ainda possvel morrer, como foi o caso dos turistas holandeses - desde, claro, que voc no tome as devidas precaues. Mesmo assim, caso voc se perca e comece a ver elefantes caminhando sobre dunas, besouros plantando bananeira e lees caando focas, sinal de que tudo ainda est bem. Isso no so alucinaes. apenas a Costa do Esqueleto revelando seus segredos.

Matria publicada
na edio 138 da revista
Os Caminhos da Terra.


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